domingo, 16 de junho de 2024

O homem do chafariz

Chafariz da Praça da Armada - 1661, créditos da Câmara Municipal de Lisboa.

Caminho pela rua, sigo tranquilo e pensativo, tinha estado com colegas que trabalham por turnos rotativos…. Dormir na vez das horas que o ditame laboral impõe, ver filhos e filhas quando dormem, deitar na cama ainda quente de pessoa já ausente…

São umas dez horas da manhã, tínhamos estado numa esplanada a tomar café, os colegas tinham trabalhado de noite, a cafeína ajudava, mas as palavras não poderiam ser longas que os olhos tendiam a fechar-se. Tinha tomado notas para o sindicato apresentar à empresa, pensativo recordo os meus tempos de onze anos em turnos, coisas do passado, quando começamos a envelhecer estamos sempre a falar do passado…

Caminho, pensativo…

Ao chegar ao chafariz da Praça da Armada vejo um homem deitado em cima de um papelão, tapado com um cobertor, resguardado do vento pelos lados curvos das guardas laterais. Não parece ter frio, quiçá o calcário lioz lhe devolve o calor que o vida lhe nega. Deve ter uns 50 anos, parece bem apresentável, paro a olhar para ele… O homem sente a minha presença e levanta a cabeça como que a indagar o que queria eu dele… Que poderia eu dizer?

Sabe-se que há gente a dormir na rua que, embora trabalhe, não consegue pagar uma renda, tomam banho e guardam roupa no lugar onde vendem barato a sua força de trabalho – tão barato que lhe rouba a dignidade de um repouso humano…

Que poderia eu dizer ao homem sem cama que dormia no chafariz sem água? O chafariz está datado de 1845, a dignidade desta pessoa também parece assim estar, 1845… Desta? Não, de tantas pessoas que dormem nas ruas nesta cidade onde são muitas mais as camas vagas para repouso de turistas… Camas sem pessoas e pessoas sem cama…

O chafariz não tem água, não tem peixes, registado com o número dez, regista também o abandono da magnífica rede de distribuição de água em chafarizes que acompanhou outras obras magníficas como o aqueduto… Transeuntes passam por ali e ignoram o chafariz sem água, ignoram também o homem sem cama que lá se acolheu, alguns turistas param e tiram fotos a jeito de não registar o sem abrigo que fez do monumento o seu abrigo sem água.

Que poderia eu dizer ao homem que me olha? Não sei o que lhe dizer, aceno a cabeça em jeito de bom dia, recomeço o caminho, pensativo…

Vítor Franco
(publicado no Jornal O Ribatejo, veja aqui)

quinta-feira, 23 de maio de 2024

Via da Prata #4


Hoje foi mesmo a doer, 69,5km sempre debaixo de um sol inclemente. Eu sabia ao que vinha, estava avisado e estudei o que devia fazer. Parti com 2,5l de água e enchi as garrafas várias vezes. Saí o mais cedo possível e decidi seguir pela estrada nacional 630, que tem mais ciclistas que automóveis. Parei em cada bomba de gasolina, em algum lugar com café, por vezes só à sombra para comer, descansar ou urinar. É aqui que entra a história muçulmana que é nem mais nem menos do que uma regra de higiene passada para regra religiosa para obrigar as pessoas a cumprir. À água somaram-se 4 géis, 4 isostar e 2 barrigas endurance. Mais três cafés...
A última subida antes de Cáceres, 494m é uma coisa que costumo fazer à vontade, foi de penar. Quando avistei a cidade deu-me uma "vineta" que dei em sprintar, qual Pogačar.
Tomado que foi o divinal banho, comer e pôr a roupa a lavar. Depois foi uma pequena visita pela cidade. Diz a Wikipédia: "Cáceres é uma cidade na região de Estremadura, no oeste de Espanha. Fundada pelos antigos romanos, mantém vastas provas da subsequente ocupação por diferentes culturas. 

O centro histórico, Ciudad Monumental, inclui uma mistura de arquitetura gótica e renascentista, com ruas medievais calcetadas, casas fortificadas e palácios. Cercada por muralhas mouriscas do século XII, tem ainda cerca de 30 torres, algumas ocupadas por cegonhas que aí fazem os ninhos."
Esta cidade património mundial merece a vossa visita.

"Está na hora da caminha/ vamos lá a dormir/ e lá fora as estrelas/ brilham a sorrir."
Amanhã vou à massagem, depois um percurso pequeno...
#viadaprata

quarta-feira, 22 de maio de 2024

Via da Prata #3


Hoje era para vos contar porque nestas viagens sigo a regra muçulmana da mão impura e da mão pura.
O facto de Mérida estar a fazer a sua festa romana anual levou-me a misturar com os residentes que se abrilhantam com roupas de cores vivas e com orgulho na sua história; centro aqui este apontamento.
Capital da província romana da Lusitânia, ou também dos visigodos, tem um muito bem preservado teatro romano, um templo a Diana, arcos, estátuas, colunas, "uma ponte de 792 metros que atravessa o Rio Guadiana, faz a ligação à Alcazaba, uma fortaleza islâmica do século IX construída sobre as muralhas romanas". Acima de tudo a cidade e o seu povo cultivam a memória, a gastronomia romana, os trajes, as lutas, as lendas...A crónica de hoje teria de se focar nesta valorização positiva e plural da sua cultura e história...
Por terras dos atuais lusitanos, pululam festas ditas medievais, pouco mais sendo do que eventos que se replicam comercialmente pelo país. A história e a cultura são diminutas em feiras que mais parecem produtos comerciais prontos a comer pelas e pelos cidadãos... Enfim...
A crónica regista alguns momentos deste meu convívio de final de dia.

Fica a sugestão de se perderam por este lugar... Podereis trazer merenda, descansar nos enormes e bonitos jardins que abrançam o Guadiana...
Nota positiva final para uma banca pela defesa da igualdade da mulher e contra a violência sobre esta...
Hoje foram mais 65km, amanhã talvez mais um pouco por motivos que amanhã partilharei... Inté...
#viadaprata

terça-feira, 21 de maio de 2024

Via da Prata #2


Hoje foram só 68km. Comecei por passar na Ribeira da Víbora para visitar o Castelo das Torres. A víbora, quando me viu fugiu em alta velocidade; acho que ela se lembrou da batalha de Aljubarrota onde 100 portugueses mataram 100.000 espanhóis...
Bem, a história do castelo reza assim: "No antigo Baldío de Calilla encontram-se as ruínas do Castillo de las Torres, uma casa-forte construída no final da Idade Média cuja função ou origem se desconhece. Preserva parte da sua estrutura, composta por três torres de base circular e diversas muralhas. A sua localização é única, perto do riacho La Vibora e da estrada que liga Monesterio a El Real de la Jara - o antigo Caminho de la Plata -, estando perto dos limites da vizinha Andaluzia".
Talvez a "Via da Prata, que deve a sua origem a um conjunto de estradas romanas que ligavam o sudoeste ao noroeste da península", tenha tido neste castelo um lugar de controlo e portagem, não sei...

O trajeto foi bem mais amigável do que ontem. Fui tirando fotos às vacas... No meio do nada avisto uma pessoa, pedalo e encontro uma bela mulher. Pus-me logo a pé, ofereci água e um chocolate. É francesa e vive em Nantes, conversa puxa conversa e fomos caminhando e conversando. O meu domínio do francês ainda dá para dialogar e é sempre bom obrigar o cérebro a ir buscar as palavras que estão no fundo do baú. A bela senhora (...) bem, na realidade (...) já tinha 64 anos, 2 filhos, 4 netos, era menos feia do que eu... Bem, espero que quem esteja a ler não estivesse já com pensamentos libidinosos... Mas, a senhora gostou do chocolate...
Bem... Retomo a pedalada que era hora de almoço. Chego às 12:30 a um restaurante de Fuente de Cantos, mas, uff, a cozinha ainda não estava aberta... Bem, pela terceira vez comi batatas fritas com dois ovos e um bife...
Pronto, já escrevi muito . Cheguei a Zafra, estou no albergue e agora vou dar banho à bicicleta...
#viadaprata

segunda-feira, 20 de maio de 2024

Via da Prata #1


Primeiro dia: Sevilha a El Real de la Jara, 83 km com o belo equipamento dos Desafios Positivos D+ para enfrentar o desafio.
Primeiro, um pedido: alguém sabe porque é que o relógio sai do track do percurso? Será porque este é muito grande? Só registou contínuos os primeiros 43km...
Primeira impressão: pedalar no "deserto". Uff, são dezenas de km sem ver ninguém, é só coutadas privadas de caça e agricultura; Kms e Kms quase sem árvores. Sem árvores não há pássaros - até às águias estão recolhidas
Primeira experiência de bicicleta gravel: a minha verdinha [que troquei com a de estrada] dá muito mais agilidade do que a de BTT. O facto de não trazer alforges também ajuda. Tem algumas desvantagens: o pneu é mais fino e tem menos rasto, portanto agarra menos na terra. Subir só com o dito cujo no selim bem no lugar, se o levanto o pneu traseiro perde logo aderência e derrapa. É também mais inseguro a travar. Consequência, calma leão, descidas "a abrir" nem pensar, emoção zero - cuidados maiores. Uff...

A manhã foi muito quente, depois esta coisa de subir e descer e subir e descer sem poder aproveitar a embalagem é uma chatice e mais cansativo... Mas pronto. Comi um bom almoço em Castilblanco de los Arroyos e bebi uma cervejinha Estrela Galizia sem glúten. Comer sem glúten é sempre uma dificuldade, pelo menos na cerveja a Espanha dá "bigodes" a Portugal.
A tarde foi mais fresca que eu falei com o S. Pedro. Ah... O roteiro diz" antes de Almadén de la Plata tem uma subida abrupta, mas curta, ao Alto del Calvario (554 m), onde se encontra um miradouro da Serra Norte de Sevilha. Com altas temperaturas, o seu nome “Calvário” fará todo o sentido". Ora, o Franco gosta disto mas não gosta de calvários, acresce que já estava fraquinho e zás estrada com ele , aliás, nunca mais saí da estrada - mesmo assim já mereço o descanso.
Proonnntttssss, amanhã vou fazer menos Kms, não sei ainda onde vou parar mas vai ser. Calma, muita calma...
Não há mais fotos que nada havia para fotografar...
#viadaprata

quarta-feira, 24 de abril de 2024

Há tanto abril para construir!

Caminhava a passos algo incertos, o seu corpo parecia instável, alto e magro, a fazer-me lembrar o bom gigante Torres que jogou no Benfica, quase esquelético, vem direito a mim.
– Senhor, senhor, preciso que me ajude, diz-me.
– Bom dia, diga o que se passa, indago eu.
Procura algo nos bolsos das calças, de lá para os de um casaco velho, mas limpo, encontra no bolso de dentro, parecia um spray para a asma.
– Senhor, preciso que vá comigo à farmácia pedir este medicamento… Sabe, senhor, eu não lhe quero pedir dinheiro, o senhor paga na farmácia, com o protocolo da Misericórdia de Lisboa é pouco…
Nunca tal tinha tido tal abordagem… O “Torres” continuou.
– Senhor não é preciso dar-me dinheiro, senhor eu preciso deste medicamento…
Disse-lhe que ia com ele à farmácia e pagaria a parte não comparticipada do medicamento.
– Para onde é a farmácia?
– Senhor, é ao pé do Egas Moniz, vamos senhor…
– Amigo, eu vou em sentido contrário, temos já ali uma farmácia… Vamos a esta.
Faz uma cara de angústia…
– Senhor, senhor, essa não tem protocolo, senhor eu não quero que me dê dinheiro, vá comigo senhor…
– Quanto lhe custa o medicamento se você for à farmácia que diz?
– É muito senhor, são quatro euros e meio…
Olhei para o “Torres”, às tantas doía-me a consciência de não ir com ele, às tantas era mais uma canção de pedir dinheiro para a sua dose de droga… Voltei a olhá-lo com atenção…
– Senhor, senhor, venha comigo…
Puxei da minha carteira e tirei uma nota de cinco euros.
– Eu tenho de seguir em frente, disse-lhe. Leve a nota e compre o medicamento.
Cada um seguiu o seu caminho, parei, olhei para trás, lá ia ele em passo apressado, inseguro… Lembrei-me da canção do Rui Veloso…
“… Gingando pela rua/ Ao som do Lou Reed/ Sempre na sua/ Sempre cheio de speed/ Segue o seu caminho
Com merda na algibeira/ O Chico Fininho/ O freak da cantareira
Chico Fininho…”
Há tanta doença por reparar, tanta miséria por acabar, em tanta gente que vegeta na vida ou vive na desesperança, em gente que deixou de ter força de trabalho para vender…
Há tanto abril para construir! É o nosso objetivo, construir abril! 
Vítor Franco
(Publicado no Jornal Mais Ribatejo, veja aqui)

quarta-feira, 17 de abril de 2024

Pereiro, onde as casas morrem com as pessoas!


O bairro do Pereiro foi o da minha criação, assim diria a minha mãe.

A senhora Alice tinha uma mercearia no Largo dos Capuchos, mais conhecido como o Largo do cemitério. De lá, trabalhando sem descanso, criou sozinha os três filhos.

O bairro era um lugar cheio de vida, cheio de crianças e jovens. O Largo do cemitério era o centro de todas as vivências. Era lá que jogávamos à apanhada, ao lenço, (…) à bola; de lá, por vezes, tínhamos de fugir à polícia quando o encarregado do cemitério a chamava. Queixava-se ele, e com talvez alguma razão, que a bola quando chutada por alto e entrada no cemitério partia objetos. Uma vez por outra tivemos de fugir para dentro do cemitério mesmo de noite, era uma aventura nos tempos da ditadura…

O 25 de abril teve um enorme impacto no bairro. Em primeiro lugar ele trouxe um aumento do bem-estar e do poder de compra das pessoas, com consequente benefício para a mercearia da Alice. A minha mãe passou a ir muito mais vezes aos armazéns numa velha carrinha Opel Kadett e eu passei a trabalhar mais na mercearia, o que era um problema sério para mim.

Não raras vezes a rapaziada vinha chamar-me, “Vítor, anda jogar à bola”… Grande dilema, quase sempre a bola ganhava e a mercearia ficava ao cuidado do freguês que chegasse. Aí, “Vítor, anda aviar-me”, lá ía eu… Depois voltava à bola… O problema é que a Alice detestava que a mercearia ficasse à vigilância popular, vai daí a rasoira de madeira do feijão, do grão ou do milho fazia serviço alheio ao seu fim de fabrico… Costumamos dizer bons tempos não é?

O bairro tem uma estrutura urbanística diferente do planalto, ruas retilíneas com perpendiculares, nele instaurou-se um acampamento romano como muito bem explica José Augusto Rodrigues em vídeo de O Ribatejo [veja aqui]. O bairro do Pereiro ter-lhe-á tomado nome por ser lugar de macieiras de peros, não se sabe…

A Porta de Valada já não existe, mas, a estrada para o Outeiro da Forca era a saída para as barreiras onde cheguei a apanhar pintassilgos e carrascos para a fogueira das festas de S. João. Lugares de memória…

É por esses lugares que continuo a passar, pelo menos quando faço os meus treinos de corrida. O Largo do cemitério foi alcatroado e agora tem muito mais carros do que crianças. A mercearia do Rato e da Alice também são recordações… É com alguma tristeza que se vê a queda de casas e de gentes.

Recentemente foi necessário cortar uma estrada por mais uma derrocada de um lar abandonado à sua ruína. No Pereiro as casas morrem com as pessoas… O Pereiro como a judiaria, a mouraria, outros lugares que se escapam entre os dedos da memória e da vida…

Seria interessante reavivar a memória das vivências de Santarém, a presença judaica e a perseguição aos judeus, ou os 400 anos de presença islâmica cuja mesquita estaria onde é hoje a Igreja de Santa Maria das Alcáçovas. É que a nossa identidade, dita de ribatejana, é uma agregação de povos e culturas. Mas isso faz-se com políticas públicas e uma gestão municipal e da freguesia que tragam a diversidade do passado ao presente.

Tudo isto por lembrança do Pereiro, onde as casas morrem com as pessoas!

Vítor Franco

segunda-feira, 18 de março de 2024

Crónica de uma corrida



A caminhada ou a corrida na natureza propiciam momentos prazerosos e úteis à saúde física e psíquica. O trail, palavra inglesa que se normalizou no mundo para significar prática em trilho, é também uma prática em que as e os atletas competem de forma muito mais saudável. Vejamos.

O contato com a natureza induz a necessidade da sua proteção, cria a sensibilidade para a sua defesa e cria uma relação quase biunívoca na qual o atleta precisa da natureza para a sua prática desportiva e a natureza precisa do atleta para a sua preservação. Deixar lixo pelos trilhos significa a eliminação do atleta.

Recentemente, a equipa a que pertenço, os Desafios Positivos D+, organizou uma recolha de lixo nas encostas e acessos à cidade, uma atividade também conhecida pelo anglicismo de plogingg. Infelizmente foram dezenas os sacos de lixo que enchemos, prova de uma população que não se respeita a si própria e de uma autarquia que prima pela debilidade nesse trabalho.

No trail a competição é muito mais saudável. Se alguém cai e precisa de ajuda, alguém vai ajudar de imediato, se alguém precisa de água ou alimentação partilha-se, se alguém se engana no caminho [como me aconteceu neste domingo por duas vezes] alguém vai a correr chamando quem se enganou. Neste domingo eu e as pessoas que não me deixaram ir por trilhos errados passámos a meta de mãos dadas!

No trail as corridas acabam em almoço convívio e várias vezes em baile. A festa suplanta o cansaço e as pernas ganham subitamente novas energias.

As pessoas participam sabendo que, regra geral, não têm prémios monetários. O prémio mais pretendido é a medalha de finisher, a pessoa conseguiu terminar. Mesmo os prémios de pódio são normalmente simbólicos em pequenas medalhas de madeira.

No caso da prova do passado sábado, o Corvus Trail foi uma ótima organização da equipa COA – Clube de Orientação e Aventura. Os trilhos imbricaram-se nas matas, bordejaram rios e ribeiras, o som da água e dos pássaros saudavam-nos e diminuíram o nosso esforço. Milhares de belíssimas flores de esteva “fugiam” dos eucaliptos e partilharam connosco as encostas semiáridas. O branco, o roxo, o amarelo e o verde pintaram encostas, aqui e ali ainda surgindo o negro de restos rasteiros de árvores calcinadas.

O equinócio da primavera está à porta, que seja um incentivo para caminhar com os Desafios Positivos. Todas as quintas, pelas 19h30, partimos da nossa sede [os D+ são uma equipa da SRO Santarém] para caminhar. A natureza espera por si!

Vítor Franco


sexta-feira, 15 de março de 2024

Vencer o medo!


A história começa com um telefonema…

– Está, Vítor?

– Sim, olá amigo…

– Tenho uma proposta a fazer-te, podemos tomar um café?

– Claro, [café marcado, nós portugueses fazemos quase tudo à mesa] lá estarei.

Chegado ao dia, lá estou. Cumprimentos de bons amigos e chegámos ao tema:

– A 17 de março de 2014 faz 100 anos que foi criada a primeira central sindical portuguesa, a União Operária Nacional, e foi aqui em Tomar, diz-me…

Como foi possível eu ter-me esquecido, pensei. Bem, afinal todas as pessoas e entidades se esqueceram: a CGTP, a UGT, a Câmara Municipal de Tomar (…), todas as entidades!

E ele explica, faz-me o contexto histórico, dá-me conta dos protagonistas e, acima de tudo, da vontade de vencer o medo da opressão e da prisão. Vencer o medo, pensei, afinal como está atual… O medo é a primeira arma de opressão, um trabalhador com medo não luta por uma vida digna, aquieta-se aos ditames, treme perante a precariedade, traz a ansiedade do fim do mês com ele… O amigo tinha razão, havia que agir.

Juntámos um grupo de sindicalistas da região e fizemos um plano de comemorações. Criámos páginas “Vencer o medo” no Facebook e no wordpress, pedimos a cedência de instalações à Câmara, organizámos debates, exposições, aliámos a história às atuais lutas laborais e à mensagem: Vencer o medo. Criámos um manifesto que a dado passo dizia:

“A fundação da primeira central foi um passo positivo que juntou as forças do mundo do trabalho numa organização comum. Foi a coragem de ir à luta que conseguiu vitórias na redução do horário de trabalho para as 8 horas diárias, na criação de seguros sociais ou bairros de habitação social. A UON dinamizou o protesto contra os especuladores e açambarcadores de bens, pela defesa da paz e contra a entrada de Portugal na 1ª guerra mundial.

É admirável a coragem daqueles e daquelas que venceram o medo, as prisões, os despedimentos arbitrários, a fome e a miséria para levantar a luta pelos direitos dos trabalhadores e da paz.”

Este ano a comemoração é pelos 110 anos, dez anos depois do centenário quase nada mudou. O medo continua a assolar os imigrantes nos campos do Ribatejo e Alentejo, os jovens que não conseguem um contrato a efetivo, os efetivos com medo de não serem aumentados no seu salário, os que tem medo de fazer greve, os que tem medo de ter medo…


Cinquenta anos depois do dia libertador o medo traz consigo a herança da ditadura… No medo o fraco ataca o fraco, ataca os imigrantes ou as pessoas LGBT, ou as negras, ou as ciganas, ou as islâmicas, ou as judaicas (…), ataca sempre os fracos vendo neles adversários, os de baixo contra os de baixo, como se vive-se numa guerra surda. O medo tolha o pensamento e aprofunda a alienação.

Há 10 escrevemos:

Cem anos depois a pobreza alastra pela população. Os especuladores são agora os da finança e da banca que dizima os recursos do país e os açambarcadores de riquezas multimilionárias crescem na explosão daqueles que só conseguem comer através dos bancos alimentares ou das cantinas sociais.

Talvez tenha sido na UON que Vinicius de Moraes se inspirou para escrever o poema “O operário em construção”…

“… E foi assim que o operário 
Do edifício em construção 
Que sempre dizia sim 
Começou a dizer não. 
E aprendeu a notar coisas 
A que não dava atenção…

110 anos depois continuamos a ter necessidade de dizer não!

Vítor Franco




domingo, 31 de dezembro de 2023

Para 2024 desejo-te tempo!

Relógio do Duomo de Florença, roda em sentido inverso. 

"Não te desejo um presente qualquer.

Desejo-te somente aquilo que a maioria não tem.

Tempo, para te divertires e para sorrir;

Tempo para que os obstáculos sejam sempre superados

E muitos sucessos comemorados.

Desejo-te tempo, para planear e realizar,

Não só para ti mesmo, mas também para doá-lo aos outros.

Desejo-te tempo, não para ter pressa e correr,

Mas tempo para encontrares a ti mesmo,

Desejo-te tempo, não só para passar ou para vê-lo no relógio,

Desejo-te tempo, para que fiques;

Tempo para te encantares e tempo para confiar em alguém.

Desejo-te tempo para tocar as estrelas,

E tempo para crescer, para amadurecer.

Desejo-te tempo para aprender e acertar,

Tempo para recomeçar, se fracassar.

Desejo-te tempo também para poder voltar atrás e perdoar.

Para ter novas esperanças e para amar.

Não faz mais sentido protelar.

Desejo-te tempo para ser feliz.

Para viver cada dia, cada hora como um presente.

Desejo-te tempo, tempo para a vida.

Desejo-te tempo. Tempo. Muito tempo!"

José Régio

domingo, 3 de dezembro de 2023

Mapa de rotas ciclistas, um excelente trabalho do site Con Alforjas


Já aqui referenciámos este site. Escrito em castelhano, assim o é, Con Alforjas é um site muito interessante que faz um excelente trabalho de divulgação do ciclismo na natureza, do bikepacking mas principalmente do utilização de alforges.
O site vem também demonstrar quanto mais avançado está o estado espanhol face ao português.
O trabalho deste site, que hoje aqui referenciamos, traz-nos este mês um mapa com todas as rotas que já planificaram, fizeram e divulgaram; não só no país vizinho mas também noutros países. Um trabalho detalhado e muito útil para todas as pessoas que se querem iniciar nas viagens em bicicleta ou já querem projetos mais audaciosos.
Sem mais delongas - e porque por aqui não fazemos copypaste do trabalho dos outros - aqui fica a ligação que vos vai permitir fazer já planos de cicloviagem de crescer "água na boca"...
Clique aqui e vá direto ao mapa das rotas.
Clique aqui e vá direto à página inicial do site.
Vítor Franco

REGRESSO DA GALDÉRIA

A galdéria vai para casa. O problema é que fez uma birra, quis ir num saco almofadado. A menina é exigente, uff, não é fácil aturá-la... Bem...