sexta-feira, 30 de março de 2018

Caminho Português de Santiago: bonito e durinho [aqui para o velhote].

O meu segundo Caminho de Santiago foi o português, com ida de inter-cidades para o Porto, na companhia do amigo Hugo Ferreira.


Parti sem ter feito preparação física prévia, o que teve consequências à medida que o esforço se estendia no tempo. O mau tempo, em particular a chuva e o frio, acrescentaram dificuldades.


A saída do Porto é algo confusa, até porque há três Caminhos portugueses: o do litoral, o do interior e o central que é o que nós fizemos.




Na primeira etapa, 56 km, 40 km foram debaixo de chuva - muitas vezes torrencial. A chuva tornou-se omnipresente e transformou muitos trilhos em ribeiros e trilhos secos em lama. O esforço para progredir no terreno foi muito maior.

As zonas de pedra – muitos caminhos são em antigas estradas romanas ou em pedra lisa - tornaram-se muito escorregadias e a adrenalina de descer rápido teve uma evitável queda e alguns ferimentos como consequência.

Primeira sensibilização: preparação prévia. No caso do BTT, em particular, é preciso treino de subidas curtas e íngremes, antecipação de redução de mudanças, hábitos reforçados a retirar o pé quando se usam sapatos de encaixe.

"Dançar" na lama para não cair e ficar atascado nas poças até tem a sua “piada”. Mas o que é nefando é passar por trilhos onde os suinicultores largam o aromático perfume dos porcos e nós ficando pintados de negro e “perfumados” a valer.

O primeiro dia terminou em Barcelos com mais umas curiosidades: o primeiro albergue estava fechado, o segundo não tinha roupas de cama e acabámos por ir dormir num hotel. Teve o seu lado bom: as imensas energias perdidas no dia anterior foram compensadas por um pequeno-almoço bem reforçado.

O segundo dia começou com novas peripécias: primeiro a câmara de ar da minha roda traseira “pifou”, a válvula da câmara de ar suplente ficou agarrada no adaptador de bomba de ar e a segunda câmara de ar ficou também fora de serviço; como há males que vêm por bem uma pessoa chegou-se a nós e informou de uma oficina de bikes a 100m, iupiiiiiii.

Roda reparada, lá avançámos 5 km; pois (…), só 5… As pastilhas do travão traseiro da bike do Hugo “deixaram” definitivamente de existir. Mas eis, “tam tam tam tam (…)”, nova oficina de bikes, iupiiii.

O tempo ajudou e o dia estava menos desagradável. Já tarde adiantada chegámos à temida subida da Labruja. Primeiro foi uma festa empurrar a bike “calhaus acima”. Depois a festa perdeu graça, o cansaço, o frio e a água no trilho começaram a ditar novas condições.


Em proposta mais emocional que racional (reconheço hoje) sugeri deixarmos as setas e usarmos, a olho, um trilho tentando contornar o pico da serra e apanhar o Caminho do outro lado. Bem, fez-se noite serrada, a humidade era quase total, o gps não dava “sinal de rumo”. Caminho nada!

Mantivemos a calma e resolvemos descer a serra fosse onde fosse o trilho / estradão parar. Gelados mas calmos chegámos ao alcatrão. Esperámos um carro e pedimos ajuda. Mais 6 km e chegámos a um café que nos deu comida e dormida.

As boas notícias: paisagens lindíssimas, pessoas que nos acolheram calorosamente. Obrigado aos donos do café da “Recolha do Leite” de Cepões. 5*

Segunda sensibilização: as setas do Caminho devem, em regra, ser seguidas. Afinal nós tínhamos ficado muito perto de passar o cume e chegar à povoação mais próxima.
foto do site da Câmara Municipal de Valença
A terceira etapa uniu Cepões à galega Cesantes. Muito agradável a entrada em Valença do Minho, entrar na estratégica fortaleza pela Porta da Coroada, percorrer o seu interior e sair por um túnel abobadado na Porta da Gaviarra (clique aqui e leia mais sobre Valença) é muito interessante.

Também agradável é a entrada em Tui, com uma bonita catedral do séc. XII, ruelas muitos interessantes (com subidinhas “parte-pernas” e algumas descidas em escadas arriscadas para bike); depois vieram alguns trechos agradáveis na floresta, a durinha subida a Mós e à Capilla de Santiaguiño e por fim a chegada à bonita Ria de Vigo com suas ilhotas.

Terceira sensibilização: tenha prazer no seu Caminho. “Saboreie” Valença e Tui. O Caminho não é uma corrida “papa-km” é um ato cultural e social e se for o seu caso religioso também.

Algumas bandeiras independentistas galegas começaram a ver-se em janelas, várias placas escritas originalmente em castelhano mas emendadas a spray para galego...

A última etapa da “aventura” validou as agradáveis premissas já evocadas. Gostei imenso do percurso de uns 8 km junto ao rio Tomeza, ou rio dos Gafos (em gallego-português a palavra gafo significava leproso, clique aqui e leia aqui sobre o rio que foi recuperado pela ação independente aos poderes por um grupo de cidadania), passou pela bonita cidade de Pontevedra – uma cidade bem cuidada, limpa, com um bonito centro histórico.






O Caminho intercalava trilhos, estradões e ruelas de pequenas e bonitas aldeias com cruzamentos da movimentada N-550 na qual fizemos (a meu pedido devido ao cansaço) os últimos 11 kms.

Chegámos à Praça do Obradoiro, nome que remete para o lugar onde obravam [trabalhavam] os “canteiros” que construíram a catedral. Fim deste meu segundo Caminho à lindíssima cidade de Santiago de Compostela – património mundial.


Fotos de Hugo Ferreira e Vítor Franco.
Leia aqui mais informações sobre a cidade.


Quarta sensibilização: faça-se cidadão ou cidadã ativa, defenda a natureza!

1 comentário:

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A caminhada ou a corrida na natureza propiciam momentos prazerosos e úteis à saúde física e psíquica. O trail, palavra inglesa que se normal...