quinta-feira, 15 de julho de 2021

Tomar a Bastilha

Por Jean-Pierre Houël - Bibliothèque nationale de France, Domínio público

A Tomada da Bastilha comemorou-se neste 14 de julho. Momento marcante na Revolução Francesa a revolta popular parisiense libertou os presos políticos da fortaleza.

A sublevação das gentes de baixo inspirou gerações de revolucionários em todo o mundo e marcou indelevelmente os diretos humanos colocando, no centro da política, a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão assinada por Portugal e publicada em Diário da República.

A Declaração de 1789 dizia no seu artigo primeiro: “Os Homens nascem e são livres e iguais em direitos. As distinções sociais só podem fundamentar-se na utilidade comum”; a Declaração atual, adotada pela Organização das Nações Unidas em 1948 diz:

“Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos. Dotados de razão e de consciência, devem agir uns para com os outros em espírito de fraternidade.”

Este princípio, com 232 anos, herdado da sublevação revolucionária está hoje sob ataque dos extremismos e conquistando apoios nos ódios da frustração ao regime capitalista realmente existente.

Hoje, em Portugal como no Mundo, crescem ódios que fomentam conflitos entre os de baixo para assim se proteger o poder dos de cima. Na Hungria, na Rússia, em vários países de extremismo religioso mascarado de muçulmano (…) perseguem-se as pessoas LGBT. Noutros, como na China, perseguem-se sindicalistas, jornalistas e democratas. Nos EUA discriminam-se negros numa loucura racista que teve o êxtase na presidência de Trump. No Brasil, o ódio à esquerda, lançado por corruptos em nome de um combate à corrupção, deu na presidência Bolsonaro e uma catástrofe gigantesca na saúde pública.

A tática é sempre a mesma: atacar e isolar os mais fracos ou os diferentes; a forma é sempre a mesma: sinalizar odiosa e insistentemente ciganos, negros, sindicalistas, pessoas LGBT (…); a meta é sempre a mesma: tornar exponencialmente visível as migalhas que caem da mesa do banquete dos poderosos para esconder o próprio banquete.

Cada vez que um mafioso das elites financeiras está a contas com a justiça, por nos roubar a todos, é renovada insistentemente a ladainha do RSI e das etnias! Tanta vez a mensagem é emitida que as pessoas acabam a acreditar numa perceção que não corresponde à realidade, como se uma árvore fosse a floresta. Tudo isto com a complacência de alguns órgãos de comunicação social que adoram sempre mais um bocadinho de notícias picantes e de sangue!

“…agir uns para com os outros em espírito de fraternidade” é hoje um princípio revolucionário e aparentemente utópico no desvario do ego individual e da competitividade.
Vale a pena provocar-vos e chamar Léo Ferré à nossa conversa. Ele que também faleceu a um 14 de julho. Ele, que adoraria ter estado na conquista da Bastilha, ele, o poeta e cantor insubmisso que um dia cantou ao rio Sena e de lá roubo um pouco:

“Você não se importa se vivemos ou morremos
Você é mais burro do que uma ampulheta!
É normal, você é um personagem,
Seu lugar é feito sob o grande sol
Homens e você é tudo igual
Não há misericórdia que flutua
Você está enlameado em suas profundezas!”

É isso, que lhe pergunto: quer ficar enlameado nas profundezas ou quer tomar a conquista da Bastilha?

Vítor Franco

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